segunda-feira, 25 de março de 2013

Brasil, qual a tua cara? - Breves considerações sobre uma teoria da revolução brasileira



PELO ESFORÇO COLETIVO DA ELABORAÇÃO DE UMA TEORIA DA TRANSIÇÃO SOCIALISTA PARA O BRASIL



                Existe na esquerda brasileira, atualmente um grande déficit teórico de interpretação da realidade nacional.
                Ao abandonar qualquer perspectiva de transformação radical os setores mais “tradicionais” (por assim dizer) da esquerda, deixaram de lado a tentativa difícil de interpretar o Brasil, suas particularidades no contexto do capitalismo monopolista e o que – consequentemente, deve ser a Revolução Brasileira.
                Verdade seja dita, o que o PT faz é apologética. Apresentam-se ganhos econômicos, assistencialismo, redução da pobreza. Não que isso seja lixo. Mas, se por um lado o Bolsa Família reduz a pobreza de uma forma abrupta pelo seu alcance, por outro o capitalismo financeiro vai muito bem, obrigado e a reforma agrária está parada. Não há redução da desigualdade social. Essa é a questão. A sociedade que nós, socialistas, almejamos não é essa.
                O PCdoB, incapaz de romper com sua dogmática herdada do stalinismo, sempre transpôs mecanicamente modelos. Seja nos princípios maoístas, seja quando via na Albânia o único “farol do socialismo”. Hoje, não tem constrangimentos em brilhar os olhos diante do crescimento chinês, feito à custa de alta precarização do trabalho. O caso dos trabalhadores da Foxconn ilustra bem o caráter capitalista desse modelo.
                De resto, PDT e PSB nunca foram partidos que se empenharam numa busca pela interpretação do Brasil.

Nem tudo o que reluz é ouro, ainda mais o ouro de Moscou...
Como lembra Michael Löwy, um marxista de inspiração trotskista, no estudo que precede sua antologia do marxismo na América latina, há duas grandes ciladas nas quais teóricos marxistas latino-americanos caíram ao longo da história: o eurocentrismo e o “excpecionalismo indo-americano”.
Alguns movimentos progressistas por uma análise particularista da América Latina acabaram por ficar a reboque do populismo, como o APRA no Peru, abandonando a perspectiva de transformação radical da sociedade.
Aqueles que se aproximam do marxismo no Brasil logo aprende que durante muito tempo o PCB desenvolveu uma tese errônea, que vinha de uma má interpretação mecanicista da Internacional Comunista, de que havia no Brasil resquícios feudais, a saber, o latifúndio, que deveriam ser destruídos por uma revolução nacional-democrática, de caráter burguês, para que depois se pudesse pensar no socialismo (mesmo o PCdoB, maoísta, após a contrarrevolução de 1964), o que seria possível graças à existência de uma “burguesia nacional” de caráter progressista.
O historiador Caio Prado Júnior toma a dianteira na tentativa de compreender a formação histórica do Brasil, e conclui que não há antagonismo entre a burguesia nacional e a burguesia internacional, embora acredite que feita a reforma agrária e superada a dependência do capital internacional, seja possível viabilizar um empresariado essencialmente “nacional”.
A partir da Teoria Marxista da Dependência a coisa muda. A síntese dialética entre as particularidades da constituição histórica da América Latina e de sua inserção no contexto mundial do capitalismo monopolista é feita por pensadores como Florestan Fernandes, Ruy Mauro Marini, André Gunder Frank etc.
De certa forma, as bases para essa teoria já estavam em Lênin, que percebeu que a burguesia russa era dependente do imperialismo, estando associada a ele, e não estando disposta a levar “até o fim” suas tarefas históricas, de caráter nacional e democrático, como a reforma agrária.
Porém, isso não é transposto de forma mecânica (e aqueles que conhecem o rigor teórico e metodológico do Florestan sabem disso). A questão é que o subdesenvolvimento latino-americano não é produto do atraso, e sim a forma particular que o capitalismo assumiu aqui. Não há esperanças dentro do capitalismo. Ao contrário do que acreditava Stalin (e seus seguidores acreditam até hoje), apenas o desenvolvimento das forças produtivas não é o suficiente para lançar as bases para o socialismo.
Mas dentro da tradição marxista a Teoria Marxista da Dependência não possui o monopólio da interpretação do Brasil. Carlos Nelson Coutinho, em seu polêmico ensaio “A democracia como valor universal”, trata do déficit democrático existente no Brasil, pois o que predominou ao longo da nossa história de modo a resolver as crises políticas foram as transformações feitas por cima, um acordo entre as elites, em termos gramscianos a revolução-restauração ou a “via prussiana” (em termos de Lênin e Lukács).
Florestan Fernandes, ao reconhecer que o capitalismo brasileiro havia atingido seu limite, isto é, o único capitalismo possível no Brasil é o dependente. Dessa forma, tarefas democráticas deveriam ser realizadas no seio da revolução proletária em sentido socialista.
E hoje?
                Todo partido que pretende transformar a sociedade precisa ter uma teoria – no nosso caso, do que deve ser a Revolução Brasileira.
                Temos grandes pensadores que nos deram várias pistas e vários elementos. Florestan, Carlos Nelson Coutinho, Chico de Oliveira e por aí vai...
                Como podem, então, o PSOL e o PSTU não se esforçarem nesse sentido? Só um programa não é suficientemente elucidativo, é preciso explicar porquê este e não outro programa.
                Nesse sentido, o único partido que vejo promovendo um esforço para realizar essa difícil tarefa é o PCB. Se ele está certo ou errado, não saberemos agora; o que sabemos é que diante de um cenário altamente complicado para a esquerda e em meio a uma crise capitalista, uma teoria da revolução brasileira retoma sua atualidade, ainda que não estejamos numa situação revolucionária.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Quando a pequena política fica grande...



“Não temas, minha donzela
nossa sorte nessa guerra
eles são muitos
mas não podem voar” – Ednardo


Parece clichê, mas quando a gente pensa que já viu de tudo...
            No mundo das redes sociais a coisa mais comum é uma enxurrada de compartilhamentos de absolutamente tudo que se possa imaginar. De gatinhos fofinhos, a corpos mutilados, de nota fiscal a piadinhas de bom ou mau (e bota mau nisso) gosto. Mas ontem vi algo que ultrapassa qualquer limite moral e racional.
            Quem acompanha política está acostumado a ver todo tipo de calúnia, sobretudo quando se enfrentam interesses dos poderosos. Aquilo que Gramsci chamava de “pequena política” está presente há muito no Brasil, o que permite a falta de interesse das pessoas. Mas há algo pior nisso tudo. Quando se distorce o sentido da luta pelos direitos das minorias e vemos surgindo no vocabulário do submundo da política palavras como “evangélicofobia”, ou então se afirma que feminismo é machismo ao contrário, “direitos humanos para humanos direitos”, essa pequena política ganha dimensões que nem o próprio Gramsci teria imaginado.
            Ontem à noite, algo no facebook me chamou profundamente atenção. Uma censura ao “verdadeiro monstro” Jean Wyllys (PSOL – RJ) circulava com um trecho de uma suposta entrevista que ele teria dado à Rádio CBN – que desmentiu a existência da entrevista em nota oficial. O trecho em questão demonstrava uma apologia da pedofilia e não possuía qualquer link ou qualquer fonte que comprovasse aquilo.
Imagem mentirosa divulgada
            É consenso de que a pedofilia figura no que há de mais sujo e imundo no lixão da humanidade. Ninguém em sã consciência faria qualquer tipo de concessão seja a um pedófilo, seja à pedofilia em si.
            Mas isso pouco importa ao submundo da política e às pessoas que, desprovidas de qualquer senso crítico e alheias à situação política do país, lançam na internet essa cascata fecal que inunda nossas telas sem sequer pesquisarem sobre a veracidade ou não do tema. Se antes uma mentira repetida mil vezes se tornava uma verdade, hoje basta um clique.
            A moda jovem agora é ser conservador. Fechar os olhos para o Pinheirinho, reclamar que “todos são iguais” e não se dar nem ao trabalho de ir atrás dos programas dos candidatos, fechar os olhos para a intolerância religiosa, ser contra o feminismo e por aí vai...
            Jean Wyllys, implacável na defesa não só dos homossexuais, mas dos direitos humanos como um todo, merece respeito, porque se coloca contra as forças conservadoras que engessam o desenvolvimento político do país. FORÇA JEAN!

segunda-feira, 11 de março de 2013

Curtinha - Quem ameaça o PSDB?



Qual a maior ameaça para o PSDB daqui pra frente?
            O livro que recomendei do sociólogo André Singer “Os sentidos do lulismo- reforma gradual e pacto conservador” demonstra muito bem o abandono do PT pela classe média, sobretudo a partir de 2006. Entretanto, o que acontece é que uma enorme parcela da classe trabalhadora – o subproletariado, cujas condições são piores do que as do proletariado, e que historicamente votava no PFL (atual DEM), por seu apelo à ordem, que via ameaçada pelo “reformismo forte” do PT de então.
            Em seu blog, meu amigo e camarada Jones Makaveli (http://makaveliteorizando.blogspot.com.br/) fez uma reflexão interessante sobre o discurso da Dilma no Dia da Mulher. Deixando de lado o discurso de gênero ele observou (e bem) um diálogo com a classe média, numa tentativa de reconquista.
            Se o PT não atrai mais a classe média, esta se apegou primeiramente ao PSDB (principalmente por seu discurso hipócrita “contra a corrupção”), mas em 2010 Marina Silva ocupou esse espaço, obtendo uma expressiva votação daqueles que não tinham identidade de classe com o projeto Dilma, mas que não viam em Serra alguém que representasse seus anseios, em suma, Marina ganhou votos de tucanos envergonhados.
            O PSDB precisa se atentar para aqueles que mais o ameaçam nessa campanha e, por mais incrível que pareça, não é o PT, seu adversário histórico desde 1994 o partido que mais ameaça os tucanos. A principal ameaça ao PSDB é a REDE de Marina, que com um discurso moralista, “renovado” e ecologicamente correto promete arrastar votos de uma classe média órfã.
           O PT conseguiu uma coalizão que agrada ao capital financeiro, ao subproletariado, Marina está conseguindo ganhar a classe média. Bem ou mal, nas redes sociais e na blogosfera há grande repercussão da privataria tucana, dos escândalos de Aécio, que não são nenhuma novidade. A questão é: qual a fatia do bolo que vai sobrar para o PSDB?  Terá ele o mesmo fim do DEM? Serra já se mostrou morto politicamente, Aécio é a esperança de alguma renovação.

quarta-feira, 6 de março de 2013

Qual o papel histórico de Chávez?




            Ontem, tomado pelo susto e pela emoção da notícia escrevi um artigo um pouco rápido sobre Chávez. Agora penso que cabe botar um pouco mais de razão no assunto.
            Como disse o filósofo argentino, o marxista Atílio Borón, a história mostrará qual foi o papel que Chávez cumpriu e não teremos dúvida de que o saldo será muito positivo; sem dúvida poderá se falar numa Venezuela antes e depois de Chávez, assim como uma América Latina antes e depois do comandante.
            A suposta “estabilidade democrática” na Venezuela foi garantida durante 40 e tantos anos pelo Pacto de Punto Fijo, que significava constitucionalmente a alternância no poder entre os democratas-cristãos da COPEI e a “social-democracia” da Acción Democrática, às custas de perseguições, prisões políticas, e ilegalidade para o Partido Comunista e o Movimiento de Izquierda Revolucionaria.
            Um país com um solo fértil, mas dependente exclusivamente do petróleo, importando gêneros alimentícios, alta concentração de renda e terra, uma economia tipicamente latino-americana. Entretanto, o baixo investimento estrangeiro sempre foi uma constante no país, pois o mercado interno era praticamente insignificante.
            Quase como uma consequência do Caracazo – um massivo protesto popular contra as medidas neoliberais implementadas pelo governo de Carlos Andrés Perez em 1989, seguindo a cartilha do FMI, é que acontece a tentativa de Golpe em 1992 por um movimento de oficiais de baixa e média patente, liderado por Chávez, que alteraria sem dúvida o curso da história. A simpatia que o povo venezuelano teve com essa figura foi o que evitou que o comandante pegasse uma pena de 20 anos de prisão.
            Eram esses os desafios que a Revolução Bolivariana teria de enfrentar para construir um novo país. Era preciso desenvolver o mercado interno e distribuir renda, talvez desprezando o caráter da formação social venezuelana é que alguns setores pretensamente de esquerda acusam Chávez de ser um nacionalista burguês, pouco vale a mobilização das classes trabalhadoras nesse processo, é mais cômodo pensar que a realidade está equivocada do que as teses que se defende nestas seitas. Não se pode construir o socialismo a partir da miséria.
Mas Chávez não se contentou com isso. Os altos investimentos em educação, o empenho para a universalização do acesso à educação básica e superior, a democratização das comunicações, que acabou com os monopólios e colocou os meios de comunicação nas mãos dos movimentos sociais, a formação dos consejos comunales, os referendos. Enfim, poderíamos fazer uma lista que não terminaria.
            Mas o papel de Chávez não se encerra nas fronteiras venezuelanas. Depois da ressaca das lutas populares nos anos 1980 e da ofensiva neoliberal, o que Chávez mostrou é que era possível um caminho que não rezasse a cartilha neoliberal, e mais resgatou a atualidade do socialismo como uma urgente necessidade para salvar a humanidade do trágico destino que nos reserva o capitalismo.
            Chávez resgatou as esperanças para o mundo pobre. Posso dizer que se hoje sou comunista, muito devo a Chávez, que não era um comunista, mas que nos fez despertar e perceber que a armadilha dessa globalização que queriam nos fazer descer goela abaixo, só pode ser combatida com a ruptura com o capitalismo. Chávez não viveu para ver essa ruptura, mas tenho certeza de que plantou uma semente, que já germinou, deu alguns frutos e dará muitos mais. Morales, Correa, Mujica são a expressão desse movimento, que com a CELAC deu um gigante passo à frente.
            A liderança do processo venezuelano passa agora às mãos de um histórico militante socialista, sindicalista, que conhece a realidade de seu país e que contará com pelo menos dois partidos qualitativa e quantitativamente enormes (o PCV e o PSUV), uma classe trabalhadora firme ideologicamente e disposta politicamente. Afinal, não é todo dia que se vê nas ruas milhões e milhões de pessoas com a Constituição em alto jurando o cargo de presidente.
¡GLORIA AL BRAVO PUEBLO QUE EL YUGO LANZÓ!