quinta-feira, 8 de agosto de 2013

A nova encruzilhada da esquerda brasileira




            A ascensão de massas de Junho seguramente abre novas possibilidades para o cenário atual, tanto para a direita quanto para a esquerda. Que desafios estão colocados?

O que restou de junho
            Não há dúvidas de que as manifestações de junho são um divisor de águas no cenário político contemporâneo. O que começou como luta anticapitalista, levada a cabo por forças de esquerda, permitiu que movimentos de direita organizados também impusessem sua agenda com muita força, conseguindo, com bastante êxito reforçar o descrédito em relação a partidos e demais organizações políticas como sindicatos e movimentos sociais, bem como um nacionalismo rasteiro e raso, elementos bonapartistas que, ao longo da história custaram muito caro às classes trabalhadoras e às forças progressistas.
            Entretanto, o que há de positivo é que uma aparente apatia das massas em relação à política parece ter se rompido, ainda que na forma da “anti-política”, uma posição política em si mesma.

O PT,  governo de coalizão
            Costuma-se dizer, muito bem acertado, aliás, que quando o PT ganhou a disputa política havia perdido já a batalha ideológica, não por acaso o vice de Lula era um empresário conhecido, de um partido de direita, o defunto PL. Os resultados do Plano Real, que conseguiu estabilidade monetária, à custa de uma ofensiva contra os direitos sociais que empurrou a classe trabalhadora para a defensiva. O Partido dos Trabalhadores ganha a presidência num momento péssimo para a mobilização dos trabalhadores.
            Se num primeiro momento o PT fez concessões à ortodoxia na economia, seu segundo mandato foi propositalmente mais conservador. O bloco no poder faz sua política em cima de um modelo “neodesenvolvimentista”, conforme aponta o sociólogo Armando Boito Jr.
Um desenvolvimentismo muito mais tímido do que o antigo, a ver pelo processo de desindustrialização, mas que foi capaz de agradar à maior parte da classe trabalhadora (o que Paul Singer propõe como subproletariado) por meio de programas sociais, assim como agradou ao capital produtivista e financeiro.
Enfim, a luta de classes estava equilibrada. Mas o governo foi incapaz de romper com o neoliberalismo, e mais, um setor da direita incorporou muito do programa social do PT, o que agora é motivo de grandes preocupações, já que o argumento “se a direita voltar ao poder, os programas sociais irão por água abaixo” já não cola mais. E temos Russomanos, Sérgios Cabrais fazendo valer suas políticas conservadoras sem que os mais pobres temam o fim do assistencialismo.
O que se pode depreender disso tudo é: o modelo neodesenvolvimentista já bateu no teto.

Correlação de forças
            Entretanto, o que foi positivo de junho? Pela primeira vez em muito tempo passamos à ofensiva. Algo aparentemente banal, a redução da tarifa traz consigo uma luta por direitos sociais que pede “mais Estado”.
             O que está diante de nossos olhos é a possibilidade de iniciar um profundo debate ideológico, de trazer pautas, novas e antigas bandeiras para a cena política, isto é, a possibilidade de inverter a correlação de forças, cujo reflexo no âmbito do Estado se faz notar.

O PT, a esquerda, a estratégia
            Militante histórico da esquerda, Milton Temer foi muito feliz quando, em carta aberta, alertou o PT e sua militância do perigo de repetir a tragédia da social-democracia europeia, que levou a cabo o programa neoliberal, e, por sua própria incapacidade de se colocar ao lado das classes sociais que deveria defender acabou perdendo o poder para a direita mais reacionária e fascista.
            O perigo de um vazio existe. E não seria impossível pensar na hipótese de uma renovação da direita capaz de chegar ao poder, ainda que apenas uma eventual hecatombe ameace a reeleição de Dilma.
O PT está na encruzilhada. Pode avançar ou retroceder ainda mais do que nos últimos anos. O fato é que pagará o preço por, ao longo dos últimos dez anos, não ter mobilizado as massas.
A esquerda que está à esquerda do PT (e quando digo PT incluo os partidos mais “tradicionais” da esquerda que estão no governo como PCdoB, PDT) foi incapaz de nos últimos anos construir uma alternativa viável de poder, ou mesmo de contrapoder, o que não faz de sua luta menos digna.
Entretanto, a dificuldade de interpretar o motivo pelo qual o PT governa, de entender a atual correlação de forças em nível nacional, bem como sua intransigência dificulta essa construção, para não dizer que inviabiliza. O PSOL aceita a unidade com o PSTU desde que este aceite integralmente todos os pontos do PSOL, e o PSTU faz o mesmo com o PCB que faz o mesmo com sei lá quem. Nenhuma aliança ao longo da história se constituiu assim.
Apenas bradar “revolução!” e ficar no “denuncismo” de tudo o que vem do governo será um erro tático e um tiro no pé, é ficar onde está.
Esses partidos também tem diante de si a possibilidade de, pela primeira vez em muito tempo, aparecer oferecendo respostas concretas para boa parte da população que esteve nas ruas, e mesmo para aquela que ainda não saiu de lá, afinal, deve se ter em conta que a direita tem as mesmas possibilidades de crescimento.