segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Curtinha: Dia seguinte de eleição...




            Dia seguinte de eleições é sempre assim. A gente abre um sorriso de orelha a orelha quando se lembra de certos resultados e abaixa a cabeça com um grito que ficou entalado na garganta quando se lembra de outros. Assim, comemoro os resultados em São Paulo (SP) e Macapá (AP), que elegeram Haddad (PT) e Clécio (PSOL), mas lamento profundamente a derrota de Márcio Pochmann (PT) em Campinas e Edmilson Rodrigues (PSOL) em Belém do Pará.
            Por motivos regionalescos vou me ater só ao Haddad.
            Ao contrário de alguns esquerdistas, no sentido leniniano do termo mesmo, que preferiram acreditar que dava na mesma, sendo eleitos Serra ou Haddad. Em outro texto passado já discorri sobre o assunto e não pretendo voltar a fazê-lo aqui.
            As grandes transformações sociais que se deram nas voltas e reviravoltas da História sempre se deram a custa de muita luta, muita mobilização, ou seja, sempre vieram de baixo. Aquilo que foi imposto de cima para baixo, das instituições para o povo pode ter sido um paliativo, pode ter adiado grandes mobilizações.
Esquerda Radicalóide: Negação do valor da luta institucional
Mas, quando se trata dos anseios da esquerda por justiça social, pelo socialismo, não se pode esperar que ele venha por decreto, ou por PEC. Afinal, elegemos prefeitos, vereadores ou comandantes da revolução na Câmara?
Aqui penso haver uma distorção fundamental em alguns setores da esquerda radicalóide, e não radical, cujo desprezo pela luta no terreno institucional, mesmo em momentos de refluxo das lutas populares levam a um discurso anacrônico, cujos pés não estão sob a terra, mas sob uma nuvem de fumaça que vai se esvaindo com o passar do tempo e os impede de protagonizar qualquer conquista, negando aquilo que Gramsci chama de função progressiva do Partido.
Seguindo essa linha de raciocínio, por que deveríamos abrir mão de ter alguém no Congresso para contrabalançar um Bolsonaro da vida? Porque deveríamos abrir mão de ocupar espaços políticos que possam dar visibilidade a um partido de esquerda, para que se possa acumular forças, enquanto a revolução não “vem”? Afinal, enquanto ela não chega, os trabalhadores precisam comer, os gays precisam de quem os defenda da homofobia, as mulheres precisam de quem lute contra a violência que se abate sobre elas.
E daí?
Num contexto como o nosso, derrotar Serra (PSDB), que se aliou nos últimos anos ao que tinha de pior na direita (viúvas de 1964, TFP, Integralistas e afins), significa uma derrota importante para o conservadorismo em geral. Não há dúvidas de que o diálogo com os professores, com os servidores públicos em geral, com os movimentos sociais e o olhar para a periferia serão bem diferentes, a partir da próxima gestão.
Como disse anteriormente, não tenho ilusões em relação à gestão de Haddad. Mas não será pior do que todos esses anos da gestão Serra/Kassab, que SEQUER permite a distribuição do “sopão” como caridade para os moradores de rua, que proibiu a livre expressão dos artistas de rua, que proibiu até mesmo aqueles carrinhos de cachorro-quente que tantas vezes salvavam nossa pele no final da tarde quando batia aquela fominha...

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Edmilson prefeito e unidade na esquerda





Belém do Pará vive um momento de ouro para a esquerda.
            O candidato do PSOL, Edmilson Rodrigues, que já foi prefeito por lá, tem chances reais de reverter o quadro e ganhar a eleição. Tendo sido apoiado no primeiro turno pelo PSTU e pelo PCdoB.
            Ao contrário dos mais chegados ao sectarismo infantil, achei muito positivo que no segundo turno se somassem à candidatura o PT, o PDT (mais precisamente o senador Cristovam Buarque), PPL e afins.
            O que está em jogo ali é a constituição de uma frente da esquerda para derrotar a direita retrógrada e reacionária. Verdade seja dita, todos esses partidos têm, nos últimos anos, tido comportamentos bastante estranhos em relação à própria história, mas há alguns pontos que devemos nos lembrar para não perder o chão.
            O PSOL é um partido cuja espinha dorsal é o PT. Sendo assim, seu espírito não poderia ser outro que o do socialismo, da democracia e das lutas populares.
Há uma avaliação errada por parte de muitos militantes da esquerda de que o PT se degenerou por completo. Embora haja uma desmobilização da militância, uma despreocupação com a formação de militantes enorme e falta de trabalho de base, o Partido possui sim uma base de esquerda, que tradicionalmente votou no PT desde sempre, mas que está muito insatisfeita com os rumos tomados pelo Partido.
Acontece que essa esquerda à esquerda do PT ainda não atingiu um grau de maturidade em que se pudesse constituir solidamente como uma alternativa de esquerda e quanto a isso penso que as eleições em Belém (PA) desempenham um papel importantíssimo para a esquerda.
Primeiro porque se trata de derrotar um partido que tradicionalmente preferiu se aliar ao grande capital e que conduziu a maior ofensiva contra os trabalhadores desde a Ditadura Militar.
Segundo porque é uma chance que esses partidos à esquerda dessa ‘esquerda tradicional’, por assim dizer, ou seja, PT, PDT, PSB, tem para conquistar uma base de apoio que pode fazer muita diferença na constituição de um bloco popular que possa levar a cabo um projeto de esquerda para o país.
Terceiro porque quem encabeça essa salada mista é um político cuja trajetória é mais do que respeitável e é realmente de esquerda.
Fazendo uma ponte com o Chile. Uma coisa foi quando a Frente Popular chegou, nos anos 1930, ao poder encabeçada pelo Partido Radical (de cariz pequeno-burguês), o que já significou um avanço democrático. Outra coisa foi quando uma outra frente se constituiu com a chamada Unidad Popular, mas dessa vez encabeçada pelo Partido Socialista (à época revolucionário) e pelo Partido Comunista. Acho que é um exemplo bastante didático do que pode significar essa união em Belém.
Dessa perspectiva, acho que nesse momento as rupturas com a candidatura de Edmilson Rodrigues, sobretudo por parte do PSTU e da corrente CST do PSOL, apenas atrapalham o desenvolvimento de uma potencial aliança entre as esquerdas, que precisam perder esse ranço que sempre caracterizou sua desunião mesmo em períodos críticos da nossa história.
É vital derrotar o PSDB e a direita em Belém, no Brasil, e fortalecer as candidaturas de esquerda.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Para devorar com os olhos: A história do PT, de Lincoln Secco (2011)




Escrever a história de um partido significa escrever a história geral de um país”. É com essa maravilhosa frase de Gramsci, retirada dos Cadernos do Cárcere que o historiador Lincoln Secco começa o livro “A história do PT”.
            A questão central do livro é entender como se deu o processo de transformação do Partido dos Trabalhadores. Como um partido que abrigou esquerdas para todos os feitios (esquerda católica, marxista, leninista, trotskista, eurocomunista etc) acabou se tornando um partido socialdemocrata, predominantemente.
            A explicação do historiador, para felicidade geral daqueles que não gostam de explicações simplistas, não se desgarra do contexto doméstico e internacional, o que permite uma análise mais completa e com destino, valendo-me da frase de Prestes: “não há vento favorável para quem não sabe a que porto se dirige” e este não é, definitivamente, o caso de Lincoln Secco.
            O autor faz um corte bastante interessante sobre as fases do Partido. Partindo da formação (1978 – 1983), passando pela oposição social (1984 – 1989), note-se que aqui há o fortalecimento dos movimentos sociais, a criação do MST, as “diretas já!” e o colapso do sistema soviético e a oposição parlamentar (1990 – 2002), da ofensiva política e ideológica do neoliberalismo, do declínio da militância, que marca uma nova dinâmica das ações internas no PT e, por fim, o Partido de Governo (2003 – 2010), em que a polêmica “Carta aos brasileiros” é discutida, bem como a crise do “mensalão” e a recuperação eleitoral do PT já nas eleições de 2006.
            Não tratarei aqui da conclusão porque penso que o autor é bem claro na sua narrativa em todos os momentos do livro.
Por que ler “A história do PT”?
            Lincoln Secco conseguiu neste livro traçar uma narrativa trajetória de forma muito objetiva , com alto rigor científico, superando tanto as visões ressentidas, quanto as "exaltatórias" que não contribuem para a historiografia do Brasil e consequente compreensão da realidade. Fundamentou suas análises não em achismos, mas em fatos, e, principalmente, diferentemente das análises que saíram por aí nos últimos anos não credita o aggiornamento do Partido a uma figura individual, ou ao oportunismo e nem reduz o PT ao mensalão, como quer a direita e como as pessoas que preferem fatos de fácil digestão preferem acreditar, mas a uma série de fatores internos e externos que influenciaram rotundamente as diretrizes do partido.
            Em tempos de julgamento do “mensalão” em que o que pretende o setor conservador do país não é uma mera punição dos réus no processo, mas derrotar um projeto político e mais, uma biografia política de um partido de esquerda que protagonizou muitas lutas populares ao longo dos anos, é fundamental ler este livro para que se ajude a compreender os motivos dessa guinada histórica e tirar lições dela para o futuro, pois é nele que a esquerda pensa.
           

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Dirceu e Genoino condenados, e daí?




              
              Não sou contra a punição de corruptos, mas sobre este caso, devo fazer algumas considerações.
                Foi instaurado no Brasil um novo tipo de julgamento e foi atribuída ao STF mais uma função.
               
                O método dedutivo
                A melhor análise que vi sobre o assunto, até agora, foi a que fez o escritor Wladimir Pomar (http://migre.me/barcz). Nela, o autor faz considerações muito pertinentes, como a de que “O STF adotou o papel não só de julgador, de acordo com a lei, mas também de legislador, modificando princípios legais, alguns deles tidos como pétreos, com o objetivo claro e insofismável de condenar a maioria dos réus”. O caso está sendo levado à corte internacional por um conselheiro da OAB – GO. (http://dm.com.br/#!/texto?id=64691).
                Acho extremamente problemático o método dedutivo utilizado no julgamento, que foi puramente dedutivo.  Desde a época da Ditadura não se tinha um julgamento político em que um réu político era prejulgado e pré-condenado antes de se sentar no banco dos réus, sem a presunção da inocência, que é base do nosso Código Penal. O Estado é quem deve provar que o réu é culpado e não o contrário.
                Para o ministro Marco Aurélio Mello: “Tivesse Delúbio Soares a desenvoltura material e intelectual atribuída a ele, certamente não seria apenas tesoureiro do partido”. Talvez pareça cômodo pensar que ele está correto. Mas se tratando da maneira de deliberar sobre a vida de um cidadão, por pior que este seja, isso se torna extremamente preocupante.
                O argumento para condenação de Genoino é ainda pior “Genoino era o presidente do partido que esteve envolvido nessa tramoia” e que, assim sendo, não teria como ele não saber do esquema.
                O Estado democrático de Direito, com todas suas limitações que conhecemos bem, é uma conquista. Se há quem prefira o Estado de Exceção e sua forma de atuar é outro papo.
                Também penso ser extremamente perigoso basear-se apenas no que disse Roberto Jefferson do PTB para realizar o julgamento dos dois. Some-se o fato de que ele é oposição ao atual governo, inclusive Jefferson está apoiando a candidatura de Serra em São Paulo, isto é, seria como pedir a um homem chifrado sua opinião sobre a sua mulher e tomar isso como verdade absoluta. Indícios não são provas e não podem ser tomados como tais.

               
A mídia
                O julgamento do ‘mensalão’, termo cunhado por Roberto Jefferson (PTB – RJ), foi rapidamente transformado em uma “Avenida Brasil” versão toga pela grande mídia. Rapidamente se escolheu o mocinho e o bandido. O mocinho seria idolatrado um exemplo vivo, como o seu Zé, que achou 5 mil reais na rua e devolveu para o seu dono e por isso deve ser colocado num pedestal e exaltado pela escola de samba no próximo carnaval. Para quem pensa que estou exagerando, convido a ver com os próprios olhos o que a Veja dizia de Joaquim Barbosa em 2009 e o que diz dele agora: http://migre.me/bas95.
                Como disse Joaquim Barbosa, em se tratando de Mensalões a imprensa tem dois pesos e duas medidas. Ninguém questiona porque o STF não julgou ainda o mensalão tucano, que não existiu só em Minas Gerais, durante o governo Azeredo, uma vez que a primeira vez durante o período democrático atual (1988 - ...) em que se ouviu falar de compra de votos foi durante o Governo FHC, para a aprovação da reeleição. O crime está prestes a prescrever e não será passível de julgamento. Paulo César Peréio bem disse que se fosse o PSDB e não o PT, e se fosse o Banco Itaú e não o Rural, o julgamento não teria chegado onde chegou.
                A grande mídia ignora também que um sócio de Marcos Valério ligou 37 vezes para o comitê financeiro de Serra, durante a campanha de 2002, o que é no mínimo estranho. (http://sphotos-e.ak.fbc).
                Além disso, o STF se deixou pautar pela mídia, conforme apontou o brilhante jurista Dalmo Dallari, sendo que ambos se esqueceram de suas responsabilidades, transformaram divergências entre ministros num verdadeiro fla-flu. O vazamento de informações sobre o julgamento também atrapalhou e muito o processo (confira a entrevista em http://migre.me/batnx). Dallari também criticou o fato de Barbosa ter permitido que um jornalista acompanhasse a elaboração de seu voto, o que sem dúvida pesa na hora de pensar em como agir.
                Lições para a esquerda
                Acho que o maior crime que cometeram Dirceu e Genoino foi ter conduzido a guinada à direita que o partido deu, sobretudo após as eleições de 1998. Pela experiência política dos dois, não sei se é possível que isto se desse pela ingenuidade de ambos, acho que foi oportunismo.
                Por fim...
No que tange a indícios, Genoino foi condenado por ser presidente do PT na hora errada.
Mas o que há de mais perigoso nessa história é que os ataques da direita não são ao PT, mas ao projeto político histórico do PT e sua identificação como a maior força da esquerda que o Brasil já teve. Como disse Leonardo Boff, eles batem no saco pensando no gato que está dentro dele. (http://pagina13.org.br/2012/09/manter-viva-a-causa-do-pt-para-alem-do-mensalao/).
Tal ataque é infundado porque o mensalão nada mais é do que a corroboração do abandono do projeto democrático-popular que o partido adotara.
De qualquer forma, o principal debate que deveria se desdobrar é sobre o financiamento público de campanhas políticas, que é a única forma de conseguir apertar o cerco contra a utilização de caixa 2 em campanha, uma prática comum a todos os partidos que aceitam doação de pessoa jurídica.
Mas há algo mais perigoso nisso tudo. As pessoas estão tecendo loas a um STF que deixou livre Daniel Dantas, o assassino da irmã Dorothy e que tentou a duras penas extraditar Cesare Battisti para a Itália. Que belo exemplo de tribunal democrático, digno de puxa-saquismo mesmo.