Esquerda
nostálgica
Essa
corrente é essencialmente stalinista e possui vários problemas. Não só não é
capaz de fazer a análise concreta de situações concretas, como também vive no
passado. Se rompeu na prática com a II Internacional, sua leitura do que é o
marxismo ainda é próxima da elaborada por Kautsky, “baseado em leis econômicas
que previam o colapso do capitalismo” (McDonough; 1980). O capitalismo soube
ser muito criativo para superar suas crises, como demonstrou o desenrolar da história.
Não há maior
esquematização reducionista do marxismo do que a feita por Stalin, quase uma
“biologização” do marxismo, que passou de uma teoria social que dá elementos
para a crítica da sociedade burguesa a uma doutrina, que recebeu o nome de
“marxismo-leninismo” e passou a ser uma ciência geral (NETTO; 1982).
Estabelecem-se “leis” e “condições” para a aplicação do marxismo, que derivam
no empobrecimento e redução do objeto de análise.
A implicação
prática dessa leitura determinista e economicista é que a história passa a ser
concebida como uma série de estágios lógicos que levam necessariamente ao
comunismo, de forma evolucionista. Essa concepção cria bases para o pragmatismo,
característico dessa corrente.
O culto que
se faz à imagem de um homem infalível, além de ser de uma religiosidade
infantil, prejudica a compreensão da teoria social de tradição marxista. A historiografia dos “grandes homens” é
uma historiografia burguesa. Devemos ser mais racionais, apreender o
materialismo histórico e deixar as paixões platônicas guardadas para os que
pretendem escrever a história de um ponto de vista ideográfico.
Limitando-se a denunciar “desvios” supostamente reformistas
e trotskistas, não se empenha na análise crítica do mundo contemporâneo. Repete
velhas fórmulas e não se interessa em pensar nas insuficiências do mal chamado socialismo real, bem como as causas de
seu fracasso.
“O
chamado socialismo real promoveu a supressão da propriedade privada dos meios
de produção sem, com isto, instaurar um ordenamento político compatível sequer
com os padrões de exercício da democracia-método.”(Netto;1980 [p.49])
Recusa-se a reconhecer a ausência de democracia nos países
que adotaram esse modelo, vendo-os como o paraíso, afirmando que a democracia é
um valor burguês e, portanto avesso ao movimento socialista, bem como não
reflete sobre caráter do trabalho nessas sociedades. Ricardo Antunes (2011) bem
coloca que:
“O
empreendimento socialista não poderá efetivar outro modo de vida se não
conferir ao trabalho algo radicalmente distinto tanto da subordinação
estrutural em relação ao capital quanto em relação ao seu sentido heterônomo,
subordinado a um sistema de mando e hierarquia, como se deu durante a vigência
do sistema soviético [...] Não é possível compatibilizar trabalho assalariado,
fetichizado e estranhado com tempo verdadeiramente livre”. (p.75)
Baseada na teoria realista da ciência política (o choque
entre os Estados), dá apoio a qualquer tipo de Estado que represente uma oposição
à política dos EUA. Dessa forma, esse setor não vê problema em apoiar Estados
teocráticos, em que há opressão à mulher (como o Irã), governos que não estão
minimamente comprometidos nem com a classe trabalhadora, nem com a democracia,
nem com o socialismo. Não vê problema em apoiar governos populistas de direita,
como o de Putin.
Isso se dá porque, como muito bem escreveu o sociólogo
Ricardo Musse (2011), “a velha esquerda prefere um Estado forte à democracia”, porque
se prende apenas à dicotomia “imperialista/anti-imperialista”, mas
principalmente porque ela “interpreta o presente com os olhos congelados no
passado. Deixou de acompanhar as mudanças no mundo – em geral desagradáveis
para ela”. Entretanto, como ela se encontra alheia à situação contemporânea,
não possui qualquer perspectiva dirigente e se a possui é uma quimera. O que
restou foi então o nacionalismo sem qualquer conteúdo de classe.
Bibliografia
ANTUNES, Ricardo. As lutas
sociais e o socialismo na América Latina no século XXI. São Paulo: Boitempo
Editorial, 2011.
MCDONOUGH,
Roisín. A ideologia como falsa consciência: Lukács in da ideologia Rio de
Janeiro: Zahar Editores, 1980.
MUSSE, Ricardo. Por que a velha
esquerda se ilude com Khadafi? Consultado em 27/02/2013 http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/ricardo-musse-por-que-a-velha-esquerda-se-ilude-com-kadhafi.html
NETTO, José Paulo. Notas sobre a
Democracia e a Transição Socialista in
Revista Temas de Ciências Humanas Nº 7. São Paulo. LECH, 1980.
NETTO, José Paulo. A elaboração teórica da direção stalinista in Stalin – Política. São Paulo: Editora
Ática, 1982.
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