As
atividades da universidade me deixaram um tanto afastado do blog nos últimos
tempos, assim como a “ressaca pó-provas”. No entanto, para não deixar em branco
publiquei três textos extraídos de um “artigo de brinquedo” que escrevi mais
para esclarecimento próprio do que para qualquer outra coisa, cujo título é
“socialismo e democracia”.
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“Quem
detém os meios de produção material, detém os meios de produção intelectual”
(Marx e Engels – A ideologia alemã)
Vamos
ao que interessa!
Não
é de hoje que tenho essa preocupação,
mas há algo que tem chamado muito minha atenção nesses últimos dias. A
cruzada contra os direitos humanos.
A
cidade
A
urbanização no Brasil tem nos anos 1980 seu ápice não escapando da lógica
histórica de um certo laissez-faire (deixar
ser) na organização da cidade, sobretudo na questão do processo de favelização,
o que implica num crescimento desordenado, acelerado e que não escapa daquilo
que permeia o capitalismo, a marginalização social e a luta de classes.
O modelo de
cidade que se tinha até então entra em crise. Devido à falta de projetos de
cidade a serem oferecidos pela esquerda (recuperando-se da ditadura) e da
direita em crise, a solução neoliberal se apresentou. (Sobre o assunto
recomendo o artigo de Carlos Vainer – “Cidade de Exceção”). Não pretendo me
alongar sobre esse apaixonante tema para não desencorajar o leitor, pois tratar
do assunto com calma demandaria muito trabalho meu e muito tempo de leitura.
A cidade
neoliberal não escapa da ideologia dominante, que tem, como aponta José Paulo
Netto, na “criminalização da pobreza” e na “militarização da segurança pública”
as faces contemporâneas da barbárie.
Se
no final da ditadura estava claro para a maioria do que se convencionou chamar
de opinião pública (que é uma abstração do senso comum que vou adotar para
facilitar a comunicação) a necessidade de ter os direitos humanos como
inalienáveis, uma meta a ser cumprida e um ideal a ser defendido, hoje a
situação se inverte, e a nova moda é defender direitos humanos para “humanos direitos”.
Mas
quem são os “humanos direitos”? - De novo a ideologia...
A
concepção que Marx tinha de ideologia era a de que ela era uma falsa
consciência, não uma mentira, mas uma falsa representação do mundo real. Os
estereótipos que se têm nessas proposições não fogem dessa concepção.
No
caso de São Paulo (SP) as gestões de Serra (PSDB) e Kassab (PSD) são quase que
um modelo da face contemporânea da barbárie, e o modo de governar que mais
agrada aos “humanos direitos”.
A questão da
moradia foi deixada de lado. O centro abandonado, com tantos prédios vazios não
pode ser desapropriado para os sem-teto, afinal deve haver algo de
anti-democrático em reivindicar uma casa, vide o Pinheirinho.
Os
usuários de droga tratados como criminosos comuns, e não dependentes químicos,
ou seja, a militarização não é apenas da segurança pública, mas das questões
sociais como um todo, o que é uma regressão histórica impressionante, sobretudo
quando se tem em conta que o partido que governa o país hoje teve sua gênese
num período de ascensão das massas e das lutas sociais.
Hoje
(dia 21/05/2013) quando escrevo esse texto, uma notícia me chocou muito (http://passapalavra.info/2013/05/77661). Tratando do já conhecido modus operandi da Polícia Militar (que
até a ONU reconheceu que precisa ser extinta) em uma ação contra três bandidos
terríveis, isto é, contra três crianças de rua , que eram agredidas por dois
policiais militares, a repórter descreve uma situação em que em nenhum momento
o policial com o qual discutia afirma que não agrediu as crianças, pelo
contrário, justifica a agressão aos “bandidos”.
A
reivindicação mais justa
E
ainda sim, Datena, Luciano Faccioli, Wagner Montes e outros tipos de fascismo
3.0 da era da comunicação continuam batendo recorde de audiência sem que
ninguém coloque em questão qual o papel social que estão cumprindo. Os meios de
comunicação não são confrontados em nenhum momento sobre sua função social.
São
esses programas que reproduzem a ideologia da criminalização da pobreza,
oferecendo como resposta fácil “meter bala”, “prender os vagabundos”, como se a
eliminação física fosse resolver uma questão estrutural, ocultando um debate
maior a ser feito. Mas não se contentam com isso, também precisam dizer a
“verdade” contra aqueles que “defendem bandidos”.
O
curioso é que o argumento é “no dia em que vocês forem
assaltados/sequestrados/estuprados/ou-o-que-seja” é que eu quero ver, como se
morássemos num mundo à parte, como se nunca tivéssemos passado por uma situação
semelhante. Não resolve o problema.
Não
preciso me ater aqui (até porque meu blog ainda não é tão lido quanto a “veja”)
ao porque da importância de defender os direitos humanos, quem nasceu num país
cuja tradição é a marginalização social e a criminalização das lutas sociais
deveria saber disso. E, no entanto, não
sabem. A informação não chega nem nos setores outrora intelectualizados como a
classe média, que de aliado dos movimentos sociais (anos 1980 e 1990) passou a
sustentáculo da oposição reacionária a um governo que é de um progressismo
extremamente tímido. Foi ela que elegeu a “bancada da bala” para a câmara dos
vereadores em São Paulo.
Não
há espaço para as forças progressistas nos meios de comunicação. O oligopólio
midiático, com uma linha editorial política idêntica, não permite a penetração
da esquerda nos marcos atuais. A luta fundamental, e não me importo de repetir
quantas vezes seja necessário, é a da democratização das comunicações. A
conscientização popular existente na Venezuela não é fruto de um culto à
personalidade de Chávez, mas é porque nas rádios se discute política, economia,
cultura e em alto nível, sem que se
poupe críticas ao governo se preciso for, é só ouvir as rádios da esquerda e descobrir.
É
claro que na política só se pode ir até onde a correlação de forças permite,
mas se esconder atrás de uma correlação de forças desfavoráveis tampouco é
prudente. O período histórico regressivo
que vivemos é duro, mas se nos abstivermos de levantar bandeiras fundamentais,
de tocar nessas feridas não vamos nunca revertê-lo.
No
entanto, tenho a certeza de que os direitos humanos e a necessidade de
defendê-los não será tema a ser debatido nas próximas eleições pelos partidos
majoritários, inclusive o PT, que, acomodado no poder, deixa para depois
qualquer reivindicação mais progressista que não caiba no bolso do capital.