Depois
de 12 anos parecia que finalmente a oposição venezuelana havia reencontrado seu
rumo. Depois do golpe fracassado em Abril de 2002, o boicote às eleições em
2006, Henrique Capriles Radonsky aparecia como alguém equilibrado, que estava
disposto a “manter o que é bom”, “dando um choque de eficiência”.
Capriles
apareceu sustentando uma argumentação antiga da direita latino-americana de que
haveria duas esquerdas na América Latina. Uma democrática, com a qual se pode
dialogar, conciliadora das classes, liderada por Lula e outra totalitária,
nostálgica da URSS, que quer destruir as instituições democráticas
latino-americanas, mediante propostas populistas e acirramento das lutas de
classes. O primeiro a desenvolver essa tese foi o ex-socialista Teodoro
Petkoff, convertido à religião do neoliberalismo.
Capriles,
então, apareceu reivindicando a imagem de Lula, mesmo após este ter dado seu
apoio a Chávez, e agora a Maduro. Mas Capriles teve uma virtude. Percebeu que a
oposição tradicional colapsou, e não ganhará nunca mais as eleições com seu
antigo projeto. A IV República era de um grau de corrupção altíssimo, as
políticas econômicas neoliberais destruíram o país e a alternativa liderada por
Chávez soube construir sua hegemonia. O que Capriles fez, então, foi
“incorporar” ao seu discurso as misiones de Chávez, afirmando que iria trazer a
elas a eficiência da “administração”. Seu programa, porém, fala em fazer isso
por meio de parcerias com a iniciativa privada, o que, sabemos, representa a privatização das misiones.
Quem
ainda duvidar da real cara de Capriles, por detrás das máscaras, pode acessar a
esse artigo: http://migre.me/dZvLl.
A
metamorfose – Quando a bela vira fera
Entretanto,
após a morte de Chávez, aquele dócil mocinho, de cabelo arrumadinho deu lugar a
um bicho estranho. Capriles ameaçou não concorrer as eleições, visando
deslegitima-las e desmoralizar Maduro, que foi implacável na defesa de que a oposição
concorresse às eleições e que os dois lados reconhecessem os resultados.
Capriles chegou até mesmo a afirmar que o governo e a família de Chávez estavam
omitindo a morte de Chávez para ganhar tempo, uma atitude descabida, dada a
comoção popular causada por sua morte.
Aqueles
que conhecem a trajetória de Capriles, porém, não se assustam. Aqueles que
acompanham a vida política venezuelana e sabem quem o apóia, tampouco.
O
discurso equilibrado de outrora está dando lugar a uma campanha desesperada de
ódio e medo. Um deputado no final do ano passado “saltó la talanquera”, como se
diz lá, e passou da oposição para o governo, afirmando que não poderia ser
conivente com a corrupção. Outros três suplentes da Mesa de Unidad Democrática
também abandonaram a coalizão, afirmando que a MUD se prepara para o não
reconhecimento dos resultados das eleições, o que seguramente levaria a uma
confrontação. Por esses dias, também se conheceram ligações da extrema-direita
de El Salvador (Partido ARENA – inspirado na nossa Arena, e Forças Armadas),
com ligações com Capriles. O Presidente salvadorenho Funes disse que
investigará o caso, pois suspeita-se de um plano de magnicídio.
A
estratégia da campanha está sendo a de “raptar” a simbologia do processo
revolucionário. O slogan “hay un camino” está claramente inspirado nas palavras
de Chávez. Em um comício realizado há poucos dias atrás nem mesmo o cantor
comunista Alí Primera foi poupado, tendo sido usado pela direita. (sobre o
assunto recomendo outro artigo: http://migre.me/dZvMa).
O
que está em jogo na Venezuela?
A
Venezuela é sem dúvida o processo mais avançado dentre os projetos
pós-neoliberais.
Capriles
encarna o desespero da direita latino-americana, que busca por todos os meios
voltar ao poder. Sua vitória significaria um retrocesso sem precedentes. O
projeto da integração latino-americana, não só econômica, mas política, a
organização dos movimentos populares, a volta das privatizações, enfim, a volta
dos anos 1990.
Enquanto
isso, a palavra de ordem no programa econômico de Maduro é contundente:
industrializar o país e fortalecer a agricultura. O que isso significaria? O
começo da independência econômica do país, que possui terras férteis, mas
importa comida, porque os governos anteriores priorizaram sempre o petróleo, um
país com enorme potencial exportando matéria-prima.
Felizmente,
os venezuelanos não têm ilusões e sabem que dentro dos limites do capitalismo é
impossível concretizar esse projeto. Talvez por isso uma das primeiras atitudes
de Maduro tenha sido chamar o Partido Comunista da Venezuela (que faz várias
críticas ao processo, afirmando a necessidade de sua radicalização), para se
incorporar à direção político-militar da revolução bolivariana.
Na Venezuela
está se disputando o destino da luta de classes na América Latina e a
consolidação de um projeto alternativo ao neoliberalismo, de viés socialista. A
revolução socialista não vem de cima pra baixo, ela é construída por um
processo, no qual a tomada do poder constitui uma parte (crucial, mas uma
parte). Por isso devemos estar com Maduro.
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