A
ascensão de massas de Junho seguramente abre novas possibilidades para o
cenário atual, tanto para a direita quanto para a esquerda. Que desafios estão
colocados?
O
que restou de junho
Não
há dúvidas de que as manifestações de junho são um divisor de águas no cenário
político contemporâneo. O que começou como luta anticapitalista, levada a cabo
por forças de esquerda, permitiu que movimentos de direita organizados também
impusessem sua agenda com muita força, conseguindo, com bastante êxito reforçar
o descrédito em relação a partidos e demais organizações políticas como
sindicatos e movimentos sociais, bem como um nacionalismo rasteiro e raso, elementos
bonapartistas que, ao longo da história custaram muito caro às classes
trabalhadoras e às forças progressistas.
Entretanto,
o que há de positivo é que uma aparente apatia das massas em relação à política
parece ter se rompido, ainda que na forma da “anti-política”, uma posição
política em si mesma.
O
PT, governo de coalizão
Costuma-se
dizer, muito bem acertado, aliás, que quando o PT ganhou a disputa política
havia perdido já a batalha ideológica, não por acaso o vice de Lula era um
empresário conhecido, de um partido de direita, o defunto PL. Os resultados do
Plano Real, que conseguiu estabilidade monetária, à custa de uma ofensiva
contra os direitos sociais que empurrou a classe trabalhadora para a defensiva.
O Partido dos Trabalhadores ganha a presidência num momento péssimo para a
mobilização dos trabalhadores.
Se
num primeiro momento o PT fez concessões à ortodoxia na economia, seu segundo
mandato foi propositalmente mais conservador. O bloco no poder faz sua política
em cima de um modelo “neodesenvolvimentista”, conforme aponta o sociólogo
Armando Boito Jr.
Um
desenvolvimentismo muito mais tímido do que o antigo, a ver pelo processo de
desindustrialização, mas que foi capaz de agradar à maior parte da classe
trabalhadora (o que Paul Singer propõe como subproletariado) por meio de
programas sociais, assim como agradou ao capital produtivista e financeiro.
Enfim, a
luta de classes estava equilibrada. Mas o governo foi incapaz de romper com o
neoliberalismo, e mais, um setor da direita incorporou muito do programa social
do PT, o que agora é motivo de grandes preocupações, já que o argumento “se a
direita voltar ao poder, os programas sociais irão por água abaixo” já não cola
mais. E temos Russomanos, Sérgios Cabrais fazendo valer suas políticas
conservadoras sem que os mais pobres temam o fim do assistencialismo.
O que se pode depreender disso tudo é: o
modelo neodesenvolvimentista já bateu no teto.
Correlação
de forças
Entretanto,
o que foi positivo de junho? Pela primeira vez em muito tempo passamos à
ofensiva. Algo aparentemente banal, a redução da tarifa traz consigo uma luta
por direitos sociais que pede “mais Estado”.
O que está diante de nossos olhos é a
possibilidade de iniciar um profundo debate ideológico, de trazer pautas, novas
e antigas bandeiras para a cena política, isto é, a possibilidade de inverter a
correlação de forças, cujo reflexo no âmbito do Estado se faz notar.
O
PT, a esquerda, a estratégia
Militante
histórico da esquerda, Milton Temer foi muito feliz quando, em carta aberta,
alertou o PT e sua militância do perigo de repetir a tragédia da social-democracia
europeia, que levou a cabo o programa neoliberal, e, por sua própria
incapacidade de se colocar ao lado das classes sociais que deveria defender
acabou perdendo o poder para a direita mais reacionária e fascista.
O
perigo de um vazio existe. E não seria impossível pensar na hipótese de uma
renovação da direita capaz de chegar ao poder, ainda que apenas uma eventual hecatombe
ameace a reeleição de Dilma.
O PT está na
encruzilhada. Pode avançar ou retroceder ainda mais do que nos últimos anos. O
fato é que pagará o preço por, ao longo dos últimos dez anos, não ter
mobilizado as massas.
A esquerda
que está à esquerda do PT (e quando digo PT incluo os partidos mais “tradicionais”
da esquerda que estão no governo como PCdoB, PDT) foi incapaz de nos últimos
anos construir uma alternativa viável de poder, ou mesmo de contrapoder, o que
não faz de sua luta menos digna.
Entretanto,
a dificuldade de interpretar o motivo pelo qual o PT governa, de entender a
atual correlação de forças em nível nacional, bem como sua intransigência
dificulta essa construção, para não dizer que inviabiliza. O PSOL aceita a
unidade com o PSTU desde que este aceite integralmente todos os pontos do PSOL,
e o PSTU faz o mesmo com o PCB que faz o mesmo com sei lá quem. Nenhuma aliança
ao longo da história se constituiu assim.
Apenas
bradar “revolução!” e ficar no “denuncismo” de tudo o que vem do governo será
um erro tático e um tiro no pé, é ficar onde está.
Esses
partidos também tem diante de si a possibilidade de, pela primeira vez em muito
tempo, aparecer oferecendo respostas concretas para boa parte da população que
esteve nas ruas, e mesmo para aquela que ainda não saiu de lá, afinal, deve se
ter em conta que a direita tem as mesmas possibilidades de crescimento.
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